domingo, 20 de agosto de 2017

ANGOLA: O "fantasma da guerra" como estratégia eleitoral



Após 15 anos de paz, MPLA ainda cita conflitos armados para justificar problemas que o Governo não conseguiu resolver. UNITA diz que a questão precisa ser discutida no Parlamento.

O "fantasma da guerra" foi despertado novamente em Angola, desta vez durante a campanha eleitoral.  O cabeça-de-lista do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), João Lourenço, disse que o conflito militar que durou quase 30 anos impediu que o Governo angolano resolvesse uma série de problemas.

O candidato do MPLA voltou a falar da guerra, após 15 anos de um acordo de paz, num dos seus discursos de campanha, na província do Bié.  João Lourenço, sem citar nomes, disse que o país chegou a ter uma indústria que gerava muitos postos de trabalho, mas foi destruída pelos opositores durante o conflito.

"Deixamos de ter indústria porque aqueles que hoje dizem que são democratas destruíram a indústria que Angola teve num passado recente. Mas, enquanto a missão de uns foi destruir, a nossa missão é construir".

Este discurso não é novo, diz a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o principal partido da oposição. Raúl Danda, vice-presidente do Galo Negro, minimiza as declarações do adversário de longa data e diz que a questão deve ser discutida no Parlamento.
"Já pedi várias vezes, vamos discutir aqui sem tabus, deixando que os cidadãos saibam e também ouçam com transmissão quais são as causas da guerra para evitar estas coisas". Para o vice-presidente da UNITA, o importante nesta fase é apresentar ideias para o futuro do país.

"Vamos dizer o que vamos fazer daqui para frente. Para a UNITA, a guerra deve servir apenas  para ficar no passado onde está. Culpados da guerra somos todos, nós e o MPLA, vítimas fomos todos", defendeu Danda, lembrando-se da guerra que matou mais de 500 mil pessoas.

Estratégia de campanha

O "fantasma da guerra" é levantado sempre que se questionam os feitos da governação do MPLA. Durante a campanha eleitoral, o partido no poder apresentou o seu plano de Governo em algumas universidades em Luanda, e muitos estudantes não gostaram de ouvir falar no conflito. Um deles foi Francisco Fernandes, da Universidade Católica de Angola, que lembra que a maioria dos eleitores são jovens.

"São pessoas que não acompanharam o processo da guerra. Fazer recurso ao que foi guerra faz perder a massa eleitoral que é jovem e que quer saber quais são os planos que os partidos têm para 2017/2022", critica o estudante.

Além do discurso e da apresentação do programa de Governo, desde o início da campanha eleitoral está a ser exibido em alguns canais de televisão um documentário sobre a guerra em Angola. O filme "Caminho da paz" tem sido criticado nas redes sociais.

Tempo de paz?

Há quem defenda que a prioridade deveria antes ser a reconciliação nacional – como José Patrocínio, coordenador da ONG angolana OMUNGA. Ele lembra que, apesar dos conflitos terem cessado há 15 anos, o país ainda vive situações de violência e insegurança.

"Nem tão pouco a situação da guerra tem agora efeitos em relação da situação do país. É uma tentativa de relação forçada sobre isso. Se todos nós lembramos esta situação da guerra, a maioria que é jovem lembra-se precisamente das atrocidades que temos vivido aqui. O caso Cassule e Kamulingue, os 15+2, o caso Mavungo, o do Ganga. Tudo isso aconteceu no tempo de paz".

Borralho Ndomba (Luanda) | Deutsche Welle

Foto: Mário Pinto de Andrade, líder histórico do MPLA, durante a luta pela independência

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